A MENSAGEM DE LUTERO SOBRE A MORTE.
A
morte esta constantemente presente na vida humana. É também o ponto
final da mesma. Mais cedo ou mais tarde, cada pessoa precisa enfrentá-la. Na época de Lutero, bem como na
Idade Média, a morte era vista como o implacável "último inimigo" (1
Co 15.26) do ser humano. As pessoas sentiam-se terrivelmente atemorizadas pelas
"imagens" da própria morte, do pecado, cujo "salário" é a morte, segundo
a compreensão bíblica (Rm 5.12; 6.23; 7.13), e do inferno, o paradeiro dos
pecadores não arrependidos. Muitas obras de arte mostram tais imagens com abundantes
detalhes. Para debelar esses temores, as pessoas procuravam consolo de todas as
maneiras possíveis. Boa parte da religiosidade popular daqueles tempos nada
mais era do que a manifestação de tal rirocura. Surgiu também toda uma
literatura pastoral de consolo. No inicio de maio de 1519, Marcos Schart (m. 1529), conselheiro do príncipe
eleitor da Saxônia, Frederico, o Sábio (1463-1525)6, pedira a Lutero, por
intermédio de Jorge Espalatino7, uma orientação sobre a preparação para a
morte. Lutero, muito ocupado com importantes discussões
teológico-eclesiásticas, indicou-lhe o livrinho de Staupitz, redigindo o
presente sermão apenas em meados de outubro de 1519. Em 1 de novembro,
enviou os primeiros exemplares a Espalatino, para que este entregasse alguns a
Schart. Ainda existe o exemplar com a dedicatória do punho do próprio Lutero. O
autor recebeu do conselheiro, em sinal de agradecimento, 10 florins, que emprestou
imediatamente a um pobre.O
sermão
mostra Lutero como pastor que vai ao encontro dos anseios
existenciais das pessoas, enfrentando suas mais profundas angústias e preocupações
a partir da teologia da cruz. Desvia a atenção das pessoas das terríveis
imagens que as atemorizam a dirige para Jesus Cristo, que na cruz
venceu a morte, o pecado e o inferno. Em isto se resolve também o velho
problema da predestinação. Fé evangélica é agarrar a esse Cristo que é vida. A fé, pois, é algo bem
concreto, que sustenta a pessoa não apenas no dia-a-dia, mas também no fim
desta vida, na morte. Os "documentos" da vida que se tem
em Cristo, as "promessas visíveis" de Deus, são os sacramentos, recebido
a fé. Importante também é, justamente hora da morte, o fato de o cristão fazer
parte da comunhão dos santos, confessada no Credo Apostólico, ou seja, da
comunidade terrena dos cristãos juntamente com a comunidade celeste dos anjos e
dos santos. No presente escrito, Lutero mostra com clareza que a justificação
pela fé é
o
poder pelo qual se pode viver e também morrer, ressuscitar em Jesus Cristo é o único consolo e apoio firme não
só na vida, mas também
na
morte. Este sermão é uma das mais
belas obras de toda a literatura pastoral dos primórdios do cristianismo
evangélico. A
procura
por ele foi tanta que, ainda no ano de 1519, isto é, em pouco mais de
dois meses, foi reeditado cinco vezes. Até 1525 houve, todo, 21 reedições além
de duas traduções latinas um sinal inequívoco
de sua enorme popularidade Quando nos despedimos de todos na terra, então
devemos voltar-nos para Deus somente, pois é para lá que se dirige e é para lá que nos
conduz o caminho da morte. Aí inicia a porta estreita, o caminho
apertado para a vida, por onde cada um deve se aventurar com bom ânimo, pois o
caminho é,
por
certo, muito estreito, mas não é longo.
Ocorre neste caso o mesmo que acontece quando uma criança nasce, com perigo e
temores, da pequena moradia do ventre de sua mãe para dentro deste vasto céu e
desta vasta terra, isto é,
vem
a este mundo. Da mesma forma o ser humano sai desta vida pela porta estreita da
morte. Embora o céu e o mundo em que vivemos agora sejam considerados grandes e
vastos, tudo é
muito
mais apertado e menor em comparação com céu que nos aguarda do que o ventre
materno o é
em
comparação com este céu. E por isso que a morte dos queridos santos é chamada de novo
nascimento; é
por
isso também que o dia a eles dedicado é chamado, em latim, de natalei', dia de
seu nascimento. No entanto, a estreiteza da passagem para a morte faz com que
esta vida nos pareça ampla e aquela, estreita. Por esta razão devemos crer
nisso e aprender do nascimento corporal de uma criança. Assim diz Cristo:
"Uma mulher, quando está para dar a luz, sente medo. Mas depois de dar a
luz, já não se lembra do medo, porque, através dela, um ser humano nasceu ao
mundo." Jo 16.21. O mesmo vale para a morte: devemos
livrar-nos do medo e saber que, depois, haverá muito espaço e alegria. Tais arranjos e
preparativos para essa viagem consistem, em primeiro lugar, em providenciar uma
confissão sincera (principalmente dos pecados maiores e dos que, no momento,
conseguimos lembrar com o máximo esforço) e os santos sacramentos cristãos do
santo e verdadeiro Corpo de Cristo e da Extrema-Unção, em desejar estes
sacramentos com devoção e em recebê-los com muita confiança, na medida em que é
possível obtê-los. Onde isso não é possível,
o anseio e desejo desses sacramentos
deve, mesmo assim, ser
consolador,
e não devemos nos apavorar demais com issoi3. Cristo diz: "Todas. as coisas são
possíveis a quem crê." Mc 9.23.1 Pois os sacramentos outra coisa não são do
que sinais que servem a fé e incitam a crer, como ainda veremos. Sem essa fé,
eles de nada aproveitam.