sábado, 7 de fevereiro de 2015

BONHOEFFER E O CONHECIMENTO QUERIGMÁTICO E TEOLÓGICO

     O conhecimento querigmático é o conhecimento do pregador enquanto tal; em virtude de sua função, ele deve "conhecer" aquilo que prega: o Cristo crucificado. Pelo poder que lhe é conferido pelo próprio Cristo através da congregação dos fiéis, o pregador tem plena autoridade para proclamar o Evangelho a quem o escuta e para perdoar-lhe os pecados com a palavra e os sacramentos. Não pode haver qualquer dúvida a esse respeito, porque o sujeito da pregação é o próprio Cristo. O pregador, todavia, deve se contentar com as palavras, as proposições, as recordações do evento divino; ele não pode apresentar a palavra viva e criadora de Cristo. A pregação, porém, enquanto função da congregação, está conexa à promessa de que, quando o pregador pronuncia as "palavras" e as "proposições" retamente (rede docetur), o Cristo vivo presta testemunho de si mesmo nelas. Mas como pode o pregador falar "retamente"? Esse é o problema do conhecimento teológico. 

     O conhecimento teológico é o conhecimento eclesial que tem por objeto o evento que foi preservado na memória da comunidade cristã, na Bíblia, na pregação, nos sacramentos, na oração. "A teologia",declara Bonhoeffer, "é uma função da Igreja; porque não há Igreja sem pregação, nem pregação sem memória; ora, a teologia é a memória da Igreja. Enquanto tal, ela ajuda a Igreja a compreender os pressupostos de uma pregação cristã, ou, em outros termos, serve à formação dos dogmas". O caráter eclesial do saber teológico é evidenciado por Bonhoeffer também em sua aula inaugural na Universidade de Berlim em 1930, sobre o terna "A questão do homem na filosofia e na teologia contemporâneas". Naquela ocasião, entre outras coisas, disse: "Somente como pensamento da Igreja é que o pensamento teológico se mantém em definitivo como o único pensamento que não racionaliza a realidade através das categorias do possível. Dessa maneira, não somente cada simples problema teológico é remetido à realidade da Igreja, como também o pensamento teológico se reconhece no conjunto apenas como pensamento que se desenvolve na Igreja" . A razão principal que distingue a teologia das ciências profanas afirma ainda Bonhoeffer em A k t u n d Sein  é a obediência: a obediência que ela deve à Igreja. O saber teológico deve reconhecer os seus limites e submeter-se humildemente ao juízo da comunidade cristã, a qual sabe que a Palavra, objeto da teologia, ultrapassa continuamente os limites da ciência teológica.